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sexta-feira, 24 de junho de 2011

Celso Athayde entrevista MV Bill


Postado por Mandrake em 5 de julho de 2010 ás 13:59

Fala galera do Porradão!

Nosso entrevistado desta semana é Alex Pereira Barbosa, ou MV Bill cantor de rap brasileiro e co-autor do best-seller livro Falcão – Meninos do Tráfico. Bill é um dos principais e mais controversos rappers do hip hop brasileiro. Vem aí MV Bill canta a pedra irmão.
01 – Como iniciou a sua trajetória na área social?
A minha trajetória social já vinha sendo construída, na mesma medida em que eu vinha me construindo e me descobrindo como pessoa, da realidade que vivia e via ao meu redor o tempo todo. Mas se tiver que definir um momento onde isso realmente se tornou decisivo, foi no momento em que eu assisti ao filme “Colors, as cores da violência”, um filme sobre duas gangues que disputavam o controle da venda de crack em Los Angeles. Assistindo aquele filme eu percebi as semelhanças com a comunidade onde eu vivia, Cidade de Deus, e decidi que deveríamos fazer alguma coisa para mudar.
02. Você esta rico?
Eu não, a minha vida mudou, conquistei coisas que se quer sonhei, mas estou longe de estar rico e pra ser franco nem penso nisso, acho que minha riqueza será ver essas pessoas que vivem perto de mim ter acesso as coisas que eu tenho.
03. Você ainda se considera um rapper?
Você me entrevistar é covardia, pois parte das minhas respostas são fruto de nossas discussões pessoais, daí eu fico numa encruzilhada, mas já que o bagulho é porradão, vombora então. Sou cada dia menos rapper e cada dia mais escritor, apesar que isso não me tira do rap. Hoje tenho mais prazer em vivenciar outras experiências.
04 -  -O Movimento Hip Hop sempre disse que odeia a mídia, você no entanto nunca disse isso, qual a diferença entre você e outros Mcs?
Não dá pra negar que existem diferenças significativas, muitos grupos contribuem com o movimento não indo para a mídia, pois depois que você vai pode ser uma grande esculhambação, e todo o movimento pode virar motivo de piada. A mídia é algo que te sufoca e não acredito que exista alguém preparado pra ela. Mas acredito que podemos saber ao menos o que representamos, enquanto representantes de favelas ou de juventude. Eu não odeio o sistema, eu também sou o sistema, prefiro intervir na mídia, pois ficar sentando reclamando dela é muito fácil. Difícil é você aceitar o desafio de trocar seus valores.
05 – Há pouco tempo o Mano Brown lançou com o Jorge Ben Jor um videoclipe na Globo, no programa Fantástico. Você acha isso ruim? É contra ou a favor?
Brown é do meu bonde e eu sou suspeito pra falar dele, pois tenho a tendência natural em defendê-lo. Ele ta certo sim, essa de ficar fazendo cara feia à vida inteira para as lentes de fotógrafos que esperam exatamente isso de nós já passou. Não somos mais crianças e nossa contribuição para com a juventude, sobre tudo as das favelas não é ficar escondido. Se quisermos ser referência, temos que colocar a cara, não como comédia, mas como Músicos, profissionais respeitáveis. Quando eu comecei minha carreira eu ouvia os caras falarem que quem ia na globo tava vendido, que era pra dizer não. Mas quem inventou isso? Infelizmente, uma geração inteira acreditou nesse mito e vejo 90% deles hoje infelizes, não porque não foram na emissora, mas porque suas carreiras ficaram ancoradas na favela, aonde não existe os recursos capazes de mudar nossas vidas e onde não interagimos com as pessoas que são capazes de mudar a vida da favela. Quando fui ao Faustão, na Daslu, no Fantástico e em todos os outros programas de televisão eu ouvia as pessoas do movimento falar que eu ia desaparecer em 6 meses. Continuo aqui, firme, impactando na vida das pessoas e contribuindo. A melhor maneira de contribuir com o nosso discurso é continuar dando show depois que descemos do palco. Existe outras gerações que vem acreditando nos nossos discursos de disco, mas é preciso que essa juventude nos veja praticar, se não, seremos lembrados no futuro como a geração que blefou. A Hora de botar a cara já passou, eu já coloquei, agora é a hora de todos colocarem o corpo.

06. - Você esta no ar em uma campanha com a NEXTEL. Isso é coisa de vendido capitalista, de traidor do movimento ou é a busca natural dos profissionais?
Quando eu era moleque na CDD eu ouvia muito esse tipo de discurso e isso me guiava, hoje acho essa situação muito engraçada, não que eu tenha me vendido, mas pela incoerência que é. Os “manos” querem vender seus discos, suas danças, seus quadros, seus shows de Djs, enfim, querem conseguir grana para fazer discos e clipes. Então tem que ganhar dinheiro. Pô, estamos num mundo capitalista. Mas essas bobagens de falar mal da mídia, sobre tudo da globo, como se ela fosse a emissora que manipula, já perdeu a graça. Todo mundo manipula, o que muda são os números no IBOPE. Eu nem tenho mais paciência pra esse tipo de discussão. Quando vejo Luciano Huck e Lázaro Ramos, fazendo comercial de vários produtos, eu fico feliz por um lado e esperando a minha oportunidade também. Acabei de fazer um filme e faria uma novela se eu fosse convidado. Não podemos esquecer que nossa luta, a minha luta é pela inserção social e na mídia, não pela exclusão, essa nós já temos.
07 - Você acaba de lançar um Cd com distribuição própria. Como está indo?
A pior coisa em todo o processo é a distribuição, o gargalo esta ai. Resolvi colocar um grupo de pessoas na rua e acionamos uma grande rede social, não para as pessoas comprarem por consideração a mim, mas para que as pessoas que gostam desse tipo de música ou do nosso trabalho pudessem ter acesso, e ai surgiu a necessidade da venda através dessa rede e da internet. O fato é que o resultado está muito positivo.
08. Há 12 anos eu disse a você que era melhor correr que o rap não passaria de 2008. Como você vê o rap em 2010?
Quando você dizia isso eu não entendia se você estava querendo dizer que iria estar enfraquecido ou se acabaria mesmo de uma vez. Mas se considerarmos o discursos dos MCs, eu concordo que o rap não teria vida longa, acredito que falta posição e sustentação no discurso. No Brasil não é possível fazer rap somente como entretenimento, até pelo fato do funk ocupar com o samba outros espaços nas favelas e periferias. Nesse caso, a sobrevivência do rap só vai ser possível se juntarmos a qualidade do discurso com a musicalidade. Acabar é lógico que não vai. Mas se não houver um avanço, se uma nova geração não assumir esse papel de renovação, corremos o risco de ficarmos falando sozinhos, “xingando” todo mundo sem ninguém ouvir.
09-  Em nossa viagem para o Haiti, eu vi você chorando em vários momentos. O que significou essa viagem pra você?
Ter contato com as pessoas que se parecem comigo não é muito comum quando saio do Brasil, pois de modo geral, os convites que recebemos são para shows, lançamentos de livros, premiações em países como nos Estados Unidos ou Europa, então o nosso projeto fala sobre um tipo de ambiente, mas contraditoriamente reforçamos exatamente os “ex-predadores”. Quando cheguei ao Haiti, mesmo sabendo o que iríamos encontrar, o impacto foi inevitável. Ver tanta gente passando por tudo aquilo é desumano. Eu senti naqueles dias a dor mais profunda que senti na vida. Não dormi, não sorri, não havia espaço pra felicidade. Tinha outra coisa importante ali, todas as pessoas que eu via eram negras, ou seja, eu não sentia essa dor somente porque eles eram humanos, mas a minha dor, meu sofrimento era duplo, eu via naquelas pessoas a imagem da minha família, a minha própria imagem.
10. O Estatuto da Igualdade Racial foi aprovado com muitas ressalvas e foram retirados temas polêmicos como cotas nas Universidades. Você acha que foi uma derrota ou uma vitória? Pergunto isso, pois parte dos movimentos negros tem criticado o ministro Eloi por conta dessa aprovação.
Eu acompanhei esse processo, às vezes bem perto, às vezes não tão perto. Em muitos momentos estivemos ao lado da Ministra Matilde Ribeiro, do Ministro Edson Santos e agora com o ministro Eloi Ferreira. Quem viu de perto os bastidores dessas lutas sabe bem o quanto foi difícil, a luta não era contra ninguém menos do que toda a elite, mídia, o pior, alguns partidos políticos de oposição ao Governo tomaram para si esse embate e isso engrossou o caldo e dificultou ainda mais. Analisando friamente, para nós pretos é algo simples de perceber a necessidade, para os não negros é algo pouco fácil de aceitar. Enfim, eu acredito que existam muitos motivos para comemorar a aprovação do Estatuto, foi um avanço fantástico, termos pautado essa discussão no Brasil, ter votado, levar o tema para o senado e ver o próprio governo se posicionando foi um grande avanço sim, e mais, se algumas Universidades estão contra as cotas, isso também é um grande avanço, pois a pouco tempo isso se quer era assunto. Penso que os movimentos negros precisam de unidade nesse momento, não houve derrota, houve negociação, nós pretos temos que perceber que num processo político essa sanfona é natural, o parlamento vive isso o tempo todo. Essa é minha opinião mais geral, a detalhada eu gostaria de ouvir o Ministro para melhorar minha reflexão.

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